Que
o novelo se desenrede. Sem concessões. Que a minha ficção, em vez de anular-me,
me ofereça a possibilidade de encontrar-me. Mais: de melhor conhecer-me e de
analisar-me. Uma espécie de ficção indefinida, entre dois planos, um real,
vivido, e o outro imaginado. [...] Invenção e vida. Unidas pelo fio sutil da
simpatia. É a história que está a programar o vivido. Não tenho, por isso, a
impressão de que o enredo se resolva no epílogo. Como se o tempo, circular,
tudo recuperasse sob o signo das letras. Talvez, no momento da revisão do texto,
ao chamar Clara, e não mais Patrícia à personagem, eliminando, sempre, a
primeira pessoa do singular, eu possa dar à história selo definitivo, estável.
Não sei. O que sinto, por enquanto, é que tudo isso não passa de uma
restituição. Restituição do fictício à ficção. Se lograr realizá-la, convencendo-me da sua realidade, poderei desaparecer. Ficarei
livre de Patrícia nomeando-a Clara.
QUEIROZ,
Maria José de. Ano novo, vida nova. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1978. p. 62-63.