domingo, 12 de maio de 2013

A íntima experiência do desterro

"Veio-me o ensejo de pôr-me num romance que viria a ser uma autobiografia - fala ao leitor. - Um romance em que queria pôr a mais íntima experiência do meu desterro, criar-me, eternizar-me sob os rasgos do desterrado e proscrito. E agora penso que a melhor maneira de fazer esse romance é contar como se deve fazê-lo". De si e per si complexo, porque envolvia personagens inconciliáveis, o Eu e o Outro, o pacto autobiográfico exige de Unamuno uma ampla e nem sempre auspiciosa revisita ao passado. À mercê do próprio Eu - amigo-inimigo -, debate-se no círculo estreito da criação. Ali mesmo, no "presente eterno" em que representa a "tragédia misteriosa" "da vida histórica e espiritual", põe, vis-à-vis, o Eu e seu duplo: "O Unamuno da minha lenda, do meu romance, o que temos feito juntos, o meu eu amigo e o meu eu inimigo e os demais, meus amigos e meus inimigos, este Unamuno me dá vida e morte, me cria e me destrói, me sustenta e me afoga. É minha agonia". 

QUEIROZ, Maria José de. Os males da ausência ou A literatura de exílio. Rio de Janeiro: Topbooks, 1998. p. 319.